O problema do suicídio na Polícia Militar

2 fevereiro 2, 2017

por Joaquim Moura – Psicólogo, especialista em saúde mental 

Atualmente muitos estudos sobre a correlação entre o trabalho e a saúde mental do indivíduo estão sendo feitos. Sabe-se que um ambiente estressante, opressor, que desvaloriza o funcionário e/ou que afetam sua segurança e liberdade pode estimular o desenvolvimento de um transtorno mental.

Na atualidade com os avanços sociais, tecnológicos e econômicos, emergiu também a criminalidade que tem aumentado a números assustadores. Por conta disso os policiais se sentem na obrigação de trabalhar até fora do horário de serviço, colocando a si e seus familiares em situações estressantes e perigosas.

A profissão de policial, conforme dados da Organização Mundial de Saúde e citado por Zanelli (2010), é uma das profissões mais estressantes do mundo, o que possibilita uma maior fragilidade mental aos seus profissionais. O contato com acidentes graves, mortes, ameaças a integridade física, o regime opressor e as situações de risco são apenas alguns exemplos do tipo de contexto que o policial militar esta inserido.

“Os policiais sofrem influências de vários fatores negativos que geram estresse extremo. O cansaço físico e a falta de equilíbrio emocional podem levar estes profissionais a assumirem atitudes irracionais durante crises e situações caóticas. Assim, tais atitudes ocasionam a falta de eficácia no desempenho do exercício profissional, expondo os policiais e população em geral. […] A morte é uma realidade na vida deste profissional visto que o mesmo tem que saber lidar com a morte das vítimas, dos criminosos, dos próprios companheiros de trabalho e também com a ideia de que sua própria vida corre perigo.” Oliveira e Santos (2010, p. 227)

Os aspectos laborais citados por Spode e Merlo (2006), quanto aos mecanismos disciplinares e a organização do serviço, foram discutidos por Silva e Vieira (2008) quando realizaram uma pesquisa com militares da cidade de João Pessoa com intuito de identificar a estrutura da polícia militar e sua relação com a saúde mental, verificou que o policial militar está no centro de uma conjugação de diferentes forças, tanto da organização do trabalho, quanto da precarização do mesmo, além das expectativas e realidades da própria sociedade. Além disto, a forma como estas relações de forças se conjugam podem gerar implicações à saúde mental dos profissionais, favorecendo o sofrimento psíquico, o que reverbera na incidência de suicídio, depressão e alcoolismo. (GOMES, BELEM E TELES, 2014)

Analisa-se a dificuldade dos policiais militares de procurarem ajuda especializada nos momentos de estresse, crise, traumas ou qualquer situação que possa vir a derivar um problema mental. O policial é visto como o super homem, aquele que não pode errar e nem pedir ajuda. Essa representação social do super herói faz com que o policial procure tratamento de forma tardia.

Brito e Goulart (2005) analisaram a correlação entre resultado de exame psicológico de candidatos contra indicados e a incidência de comportamento desviante, verificando, portanto, que entre os policiais militares de conduta desviante há uma significativa incidência de contra indicados no exame psicológico que foram admitidos através de meios judiciais. Isso demonstra a importância de levar em consideração a avaliação psicológica como um importante aliado na seleção de profissionais para integrar as forças auxiliares de segurança pública. (GOMES, BELEM E TELES, 2014)

Halpern (2008) fez uma pesquisa relacionando o alcoolismo às condições de trabalho dentro da vida militar. Acredita-se que o uso de álcool seja uma pratica comum na sociedade brasileira. Vive-se a cultura do álcool onde tudo começa e acaba em bebida. Para o policial militar o álcool funciona como uma válvula de escape, porem percebe-se que o controle facilmente se perde.

Muitos policiais tem pedido socorro e o resultado é o número alarmante de homicídios e suicídios causados por policiais que apresentam indícios de transtorno mental que poderia ter sido tratado, mas foi negligenciado pela sociedade.

 

suicidio policia militar saude mental

A polícia militar começa a tomar consciência da gravidade do problema e da importância em cuidar da saúde mental dos profissionais militares. Os altos índices de suicídios, homicídios e afastamento por crises mentais e emocionais que cada vez mais frequentemente tem sido divulgado pela mídia mostra como é urgente o tratamento psicológico contínuo e o trabalho de prevenção de doenças e promoção de saúde para toda a polícia. Câmara e Sougey (2001), dizem que os policiais e bombeiros militares precisam tomar conhecimento de seus sintomas e adotarem medidas terapêuticas voltadas ao combate ao suicídio. Na Bahia pode-se ver diversas ações da polícia militar para defender os policiais de transtornos que possam causar o suicídio, porém o suicídio não é único problema, não pode-se reduzir à saúde mental para essa porcentagem, todos os policiais militares precisam manter a sua saúde mental para poderem exercer seu trabalho em meio a todo o caos que o Brasil vive. Uma estrutura de acompanhamento psicológico é necessária para profissionais de todas as áreas. Para a polícia militar, dentro de todo o contexto citado se torna urgente novas politicas de promoção de saúde e prevenção de doenças mentais além de um maior investimento por parte dos governantes.

“Necessitamos cobrar das autoridades governamentais que cuidem mais dos nossos cuidadores, pois isso interessa a todos nós. Devemos nos preocupar com sua educação, suas carreiras, os seus salários, as suas condições de trabalho e sua saúde. Assim poderemos separar o joio do trigo. Não é mais plausível conceber que “erros” ou problemas comportamentais vivenciados por policiais tenham suas etiologias buscadas apenas em suas histórias de vida, por ser essa estratégia instrumental apenas à construção de um confortável efeito vacina que embasa práticas de exclusão, temporárias ou definitivas, conduzidas por aqueles que não percebem ou não se querem perceber que o trabalho tanto pode conduzir as pessoas à saúde como à doença.” (MELO, 2009).

Referências

Brito e Goulart. Avaliação psicológica e prognóstico de comportamento desviante numa corporação Militar. Psico-USF, v. 10, n. 2, p. 149-160, jul./dez. 2005

Câmara e Sougey. Transtorno de estresse pós-traumático: formulação diagnóstica e questões sobre comorbidade. Recife: Rev Bras Psiquiatr; 2001.

Câmara Filho JWS. Transtorno de estresse pós-traumático: características clínicas e sociodemográficas em policiais militares e suas famílias (dissertação). Recife: Universidade Federal de Pernambuco; 1999.

GOMES, BELEM e TELLES. Saude mental de militares: uma revisão integrativa do cenário brasileiro. Rev. Saúde Públ. Santa Cat., Florianópolis, v. 7, n. 3, p. 88-102, set./dez. 2014.

HALPERN, Elizabeth Espindola; FERREIRA, Salette Maria Barros; SILVA FILHO, João Ferreira da. Os efeitos das situações de trabalho na construção do alcoolismo de pacientes militares da marinha do Brasil. Cadernos de Psicologia Social do Trabalho, São Paulo , v. 11, n. 2, p. 173-286, dez. 2008. Disponível em . Acesso em: 03 jun. 2014.

MELO O Suplício de Sísifo: sofrimento psíquico e saúde mental no labor policial, 2009. Disponível http://abordagempolicial.com/2009/10/o-suplicio-de-sisifo-sofrimento-psiquico-e-saude-mental-no-labor-policial/. Acesso em 31 de janeiro de 2017

OLIVEIRA E SANTOS. Percepção da saúde mental em policiais militares da força tática e de rua. Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 25, set./dez. 2010, p. 224-250

Silva, M., & Vieira, S. O processo de trabalho do militar estadual e a saúde mental. Saúde e Sociedade, 2008.

SPODE, Charlotte Beatriz  and  MERLO, Álvaro Roberto Crespo. Trabalho policial e saúde mental: uma pesquisa junto aos Capitães da Polícia Militar. Psicol. Reflex. Crit. [online]. 2006, vol.19, n.3

ZANELLI, José Carlos. Estresse nas Organizações de Trabalho: compreensão e intervenção baseadas em evidências. Porto Alegre: Artmed, 2010. 128 p.

 

Comments (2)
Ariosvaldo Pitanfa de CerqueiraMarch 11Reply
Este conteúdo que acabei de ler foi de inteira importância.
Ariosvaldo Pitanfa de CerqueiraMarch 11Reply
Foi de inteura importância eu ter conhecimento que temis que busca apoio psicológico.

Comente

*